A música popular brasileira do período 1901-1916 repete basicamente as características que já predominavam no final do século XIX. São os mesmos gêneros - valsa, modinha, cançoneta, chótis, polca -, as mesmas maneiras de cantar e tocar, as mesmas formações instrumentais, a mesma predileção pela música de piano. Também continua a predominar a influência musical européia, principalmente a francesa. Uma importante novidade, entretanto, aconteceria na área tecnológica: o advento do disco brasileiro em agosto de 1902. E será o repertório registrado nesses discos que, em complementação às partituras, ensejará uma melhor avaliação da produção musical da época.

Entre os compositores do período, destacam-se três das maiores figuras da música popular brasileira: Ernesto Nazareth, Chiquinha Gonzaga e Anacleto de Medeiros. Nazareth, estilizador da música dos chorões, é o autor de extensa e requintada obra que o situa na divisa do popular com o erudito; Chiquinha Gonzaga (Francisca Edwiges Neves Gonzaga), primeira mulher a se sobressair em nossa música popular, possui também vasta obra, voltada sobretudo para o teatro; e, por fim, Anacleto de Medeiros, instrumentista eclético e organizador de várias bandas, e o responsável por algumas das mais belas composições do período. Embora tenham se tornado conhecidos no século XIX, os três viveram o auge da carreira no início dos 1900. Outros compositores importantes dessa fase são Ernesto de Souza, Eustórgio Wanderley, Pedro de Alcântara, Paulino Sacramento e o então iniciante Marcelo Tupinambá.

Já os letristas aparecem em número bem menor. Além da presença esporádica de alguns poetas (Hermes Fontes, Adelmar Tavares) e autores do teatro de revista (Bastos Tigre), sobra apenas a figura polêmica de Catulo da Paixão Cearense. Em que pesem as restrições que se fazem à sua poesia, Catulo ainda é o mais importante letrista brasileiro de sua geração. "Incapaz de escrever uma célula melódica", segundo Villa-Lobos, ele se especializaria em fazer letras para melodias consagradas de compositores contemporâneos. Assim, de carona no sucesso alheio, Catulo reforçou sua própria glória, embora em alguns casos tenha contribuído para ampliar a popularidade das canções.

Na área da música instrumental há muitas bandas (Banda Escudero, Banda Paulino Sacramento, Banda Carioca) e muitos conjuntos de choro e seresta (Grupo do Malaquias, Grupo Lulu o- Cavaquinho, Grupo O Passos no Choro) que gravaram mais da metade dos discos da época. Quase não há, porém, solistas de sucesso, constituindo-se exceções o grande flautista Patápio Silva, morto prematuramente, o também flautista Agenor Benz e os pianistas Artur Camilo e Ernesto Nazareth, este principalmente pela interpretação de suas próprias composições. Em plano mais modesto, sem terem jamais chegado ao disco, estavam os pianistas populares, os chamados pianeiros. Esses músicos eram sempre convidados para tocar em reuniões sociais, batizados, casamentos, aniversários. Além de mais baratos que as orquestras, eles conheciam bem o gosto da classe média e tocavam o instrumento de sua preferência. Não havia família. mais ou menos remediada que não ostentasse um piano na sala de visitas. Foram pianeiros famosos no Rio de Janeiro A. Chirol, Garcia Cristo, Porfírio da Alfândega e Aurélio Cavalcanti, que chegou a ser capa da revista O Malho.

Também reduzido, não mais do que seis, é o número de cantores que fizeram sucesso no início do século: Baiano, Cadete, Eduardo das Neves, Mário Pinheiro, Nozinho e Geraldo Magalhães. Embora seja difícil julgá-los, em razão da sonoridade deficiente dos discos da época, pode-se apontar Baiano (Manoel Pedro dos Santos) e Mário Pinheiro como os melhores. Não é assim por acaso que os dois foram os mais populares e os que mais gravaram. Baiano, que teve a honra de gravar o primeiro disco brasileiro (Zon-O-Phone 10001- Isto é Bom), cantava qualquer tipo de música, das alegres cançonetas às modinhas sentimentais. Já Mário Pinheiro, embora versátil também, preferia o repertório romântico, mais adequado à sua bela voz de barítono. Tendo estudado canto, participou do espetáculo de inauguração do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, em 1909. Mas, se os cantores eram escassos, inexistente era o naipe das cantoras. A rigor, não há no Brasil uma só cantora popular de sucesso antes da década de 1920. Deve-se o fato, simplesmente, à não existência desse tipo de atividade profissional em nossa sociedade machista de então. O que havia eram atrizes do teatro musicado que às vezes gravavam. As exceções seriam talvez as duas moças que, no suplemento inicial de discos da Casa Edison, aparecem cerimoniosamente tratadas como Srta. Odete e Srta. Consuelo. Sobre essas moças, as primeiras brasileiras a gravarem, tem-se apenas uma informação biográfica: eram senhoritas.

Com a deflagração da Primeira Guerra Mundial, em 1914, entram em declínio as tendências que caracterizaram nossa belle époque musical, o que coincide com o final, também, de um ciclo de idéias e costumes que imperou na virada do século.