Divino maravilhoso

Atenção
Ao dobrar uma esquina
Uma alegria

Atenção, menina
Você vem
Quantos anos você tem?

Atenção
Precisa ter olhos firmes
Pra este sol, para esta escuridão

Atenção
Tudo é perigoso
Tudo é divino maravilhoso

Atenção para o refrão
É preciso estar atento e forte
Não temos tempo de temer a morte

Atenção
Para a estrofe e pra o refrão
Pra o palavrão, para a palavra de ordem

Atenção
Para o samba exaltação

Atenção
Tudo é perigoso
Tudo é divino maravilhoso

Atenção para o refrão
É preciso estar atento e forte
Não temos tempo de temer a morte

Atenção
Para as janelas no alto

Atenção
Ao pisar o asfalto mangue

Atenção
Para o sangue sobre o chão

É preciso estar atento e forte
Não temos tempo de temer a morte


© Editora Gapa / Gege Edições Musicais Ltda


NOTE:
É muito politica, do período das passeatas, da preparação para a luta clandestina. Foi feita com muita consciência. Muitos não entenderam, achavam que os tropicalistas eram alienados porque não faziamos o papel do esquerdista convencional. Mas acho que as pessoas da esquerda convencional estavam certas, porque eu realmente não me identificava com elas, embora me identificasse com alguma coisa da esquerda. Eu me sentia à esquerda, sim, mas tinha muitos problemas com todo o pessoal de esquerda. Tinha e tenho, ainda hoje. Naquela época, tais dificuldades pareciam maiores porque eles não aceitavam o que eu estava apresentando como contribuição para a luta de esquerda. Mas, hoje, acho que eram coisas realmente diferentes, e que, numa certa medida, eles tinham mesmo razão, porque, embora em “Divino maravilhoso” e outras cancões eu estivesse relativamente apoiando as insinuações de luta clandestina, cuja coragem, heroísmo e idealismo eu louvo, naquela èéoca — e hoje tenho ainda mais certeza disso — não tinha simpatia pela instauração, através de uma revolução, de uma ditadura do proletariado. [Caetano Veloso, Sobre as letras, Editora Schwarcz, São Paulo, 2003]