Beleza pura

Não me amarra dinheiro não
Mas formosura
Dinheiro não
A pele escura
Dinheiro não
A carne dura
Dinheiro não
Moça preta do curuzu
Beleza pura
Boca do Rio
Beleza pura
Dinheiro não
Quando essa preta começa
      a tratar do cabelo
É de se olhar
Toda a trama da trança
      a transa do cabelo
Conchas do mar
Ela manda buscar pra botar
      no cabelo
É de se olhar
Toda a trama da trança
      a transa do cabelo
Conchas do mar
Ela manda buscar pra
      botar no cabelo
Toda minúcia
Toda delícia
Não me amarra dinheiro não
Mas elegância
Não me amarra dinheiro não
Mas a cultura
Dinheiro não
A pele escura
Dinheiro não
A carne dura
Dinheiro não
Moço lindo do Badauê
Beleza pura
Do Iê Aiyê
Beleza pura
Dinheiro yeah
Beleza pura
Dinheiro não
Dentro daquele turbante
      do Filho de Ghandi
É o que há
Tudo é chique demais, tudo
      é muito elegante
Manda botar
Fina palha da costa e que
      tudo se trace
Todos os búzios
Todos os ócios
Não me amarra dinheiro não,
      mas os mistérios

© Editora Gapa
NOTE:
Tem uma referência direta à canção do Elomar, que eu adoro, que fala “viola, alforria, amor, dinheiro não”.1 “Beleza pura” é uma saudação ao inicio da “tomada” da cidade de Salvador pelos pretos. Ela sempre foi uma cidade com muitos pretos mas, até os anos 70, eles ficavam mais ou menos “nos seus lugares”: puxadores de rede, de xaréu, tocadores de candomblé, pescadores, vendedores de acarajé, todos muito nobres, bonitos, mas cada Paulo, 2003] um no seu lugar tradicional. E, nos anos 70, em grande parte por influência do movimento negro norte-americano e sul-africano, mas também por desenvolvimento do mundo e do Brasil, os pretos tomaram conta da cidade da Bahia de outra maneira, e “Beleza pura” é uma saudação ao início desse acontecimento. Eu sempre estive ligado às origens dessas coisas, por isso jamais poderia sentir a antipatia que os pretensiosos do centro tinham com relação à axé music. Sem falar em “Atrás do trio elétrico”, de anos antes.2

1. Elomar (Vitória da Conquista, Bahia, 1937) é cantor e compositor. Sua obra busca aliar o clássico e o sertanejo. A canção “Violero” (de Das barrancas do Rio Gavião, 1973) diz em seu refrão: “Apois prò cantadó l violero/ só hai treis coisa nesse mundo vão/ amô, furria, viola, nunca dinhêro/ viola, furria, amô, dinhêro não”.
2. A canção apareceu pela primeira vez num compacto simples de 1968.
[Caetano Veloso, Sobre as letras, Editora Schwarcz, São Paulo, 2003]
Non mi attira il danaro, no
Ma la bellezza
Denaro no
La pelle scura
Denaro no
La carne soda
Denaro no
Ragazza nera di Curuzu
Bellezza pura
Federação
Bellezza pura
Boca do Rio
Bellezza pura
Denaro no
Quando questa negra comincia a curare i capelli
E’ da guardare
Tutta la trama della treccia nella cura dei capelli
Conchiglie di mare
Lei le manda a cercare per porle tra i capelli
Tutta la minuzia
Tutta la delizia
Non mi attrae il danaro, no
Ma l’eleganza
Non mi attira il denaro no
Ma la cultura
Denaro no
La pelle scura
Denaro no
La carne soda
Denaro no
Bel ragazzo di Badaué
Bellezza pura
Do Ilê aiyê
Bellezza pura
Denaro yeah
Bellezza pura
Denaro no
Dentro quel turbante del figlio di Gandhi
E’ tutto qua
Tutto è troppo chic, tutto è molto elegante
Fai stendere
Una stuoia di paglia sottile sulla quale si consultino
Tutte le conchiglie
Tutti gli ozii
Non mi avvince il denaro no, ma i misteri



Nota:
La traduzione è di Paolo Scarnecchia, Musica Popolare Brasiliana, Gammalibri, 1983, p. 127.